“O mundo é Bom”
Daniela Abarca, Psicóloga e Coach, mãe da Malu e da Nina
Olá pessoal, em uma curta série de pequenos textos -
a qual nomeei “Perdi o compasso, como é mesmo que se dança?” - pretendo compartilhar com vocês como a antroposofia,
linha filosófica fundada por Rudolf Steiner em meados da década de 1890,
enxerga o desenvolvimento humano através das fases da vida, conceitos expostos
no livro Fases da Vida de Bernard Lievegoed (1905-1992).
A antroposofia prega que o
desenvolvimento humano é naturalmente ritmado. No entanto, sua plenitude só ocorrerá
se o levarmos conscientemente até o fim, o que significa empreendermos ao longo
da vida uma busca também pelo desenvolvimento interior através do nosso pensar,
do sentir e do querer.
Lievegoed1 aponta que o
caminho da vida é percorrido por três diferentes vias: a biológica, a
psicológica e a espiritual. No texto de hoje quero abordar a primeira, mais especificamente
a importância da primeira infância – até os 7 anos de vida, e os reveses que
vamos adquirindo ao atropelarmos este fluxo.
Vale lembrar que é na primeira
infância que estamos abertos às impressões externas e ao aprendizado pela
imitação. Desta forma, Lievegoed1 afirma que os principais elementos
que devemos dar à criança são os sentidos de autoconfiança, de convicção e
segurança.
A autoconfiança e convicção vêm
de uma vida rítmica e da consistência nos encontros com o outro. Já a segurança
vem do amor caloroso de seu ambiente. Em outras palavras, à criança deve ser
dado um sentido básico de que o mundo é bom.
Lievegoed1 fala da
importância da vida rítmica neste processo, um elemento importante para o
desenvolvimento da confiança e posteriormente da autoconfiança. A criança deve
ter, desde seus primeiros meses de vida, uma rotina estabelecida: a hora de
despertar, de se alimentar, de brincar, de tomar banho. A repetição do ritual
irá aos poucos estabelecendo confiança na relação com o adulto, e ela vai
percebendo naturalmente que há um ciclo, já espera e já sabe o que virá depois.
Embora seja difícil estabelecer rotinas
em meio a tantas exigências atuais, o esforço vale a pena. No mundo real, este
papel nem sempre pode ser cumprido pela mãe ou pelo pai, ou, ainda, sempre pela
mesma pessoa. O importante é prezar pela realização do ritual. Posteriormente,
na vida adulta, nossa facilidade ou dificuldade em lidar com compromissos, nossa
tendência à organização e planejamento advém desta fase.
É também no ambiente familiar que
vivemos nosso primeiro campo de provas. O sentimento de ser bem-vindo é
essencial ao ser humano e fundamental ao seu desenvolvimento. Um bebê expressa
com naturalidade suas necessidades de alimento, calor, proteção. É a saciedade
destes desejos o ponto de partida para a sua segurança. Mais tarde, é ainda no
terreno familiar que exercitamos a aceitação, que somos apresentados às normas
sociais, aos valores, às crenças, e à tão importante censura.
A ausência de autoconfiança, o
sentimento de insuficiência, ou ainda de menor valia presentes em tantos de nós
podem ter raízes nesta época. A falta do cuidado – cuidado que também pode ser
um tipo de manifestação de amor – e de afeto traz o sentimento de insegurança e
desproteção, como se alguma expectativa, que nem sabemos ao certo qual é, ficasse
em aberto.
Aqui também temos uma face da
patologia social que estamos vivendo, sobretudo a pressão para que, desde cedo,
nossas crianças sejam “crianças de sucesso”: inteligentes, bonitas, saudáveis,
alegres, exemplares em seu desempenho escolar. Patologia que deflagra a
necessidade de nós - adultos, pais, professores e a quem mais couber - de conter
nossas próprias expectativas, os sonhos ainda não concretizados e deixar livres
as crianças a fim de que possam descobrir a si mesmas e se tornar tudo aquilo
que seu potencial lhes reserva.
1 Lievegoed,Bernard; Fases da Vida, crises e
desenvolvimento da individualidade; 3ª. Ed; São Paulo; Antroposófica, 1994.
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